O Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho – IPEATRA, vem a público manifestar seu mais profundo repúdio às práticas escravagistas constatadas pelas autoridades fiscalizadoras em Serra Gaúcha- RS em fevereiro de 2023. Manifesta ainda sua repulsa a quaisquer notas, discursos ou manifestações de apoio direto ou indireto a tais condutas criminosas, ainda que feitas no afã de proteger os produtores envolvidos, colocando-os sob um manto de inocência por desconhecimento dos fatos e das leis.
Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece. O brocardo latino Dura lex sed lex, versado neste art. 3º da LINDB, vem a calhar quando a cadeia produtiva do vinho brasileiro pretende se esquivar de suas responsabilidades alegando desconhecimento das práticas escravagistas adotadas por empresa terceira por ela contratada. Mesmo a reforma trabalhista de 2017, prejudicial ao progresso do trabalho decente, fixou a responsabilidade objetiva e solidária de tomadoras e prestadoras de serviços pelo meio ambiente do trabalho. A terceirização, portanto, não exime o tomador de serviço dos deveres trabalhistas e da responsabilidade pelos atos das empresas ou dos sujeitos que contrata.
Jornada, alojamentos, equipamentos de proteção, alimentação adequada, salário idôneo e conforme o prometido, tratamento digno e trabalho decente devem ser garantidos como direitos humanos fundamentais que são, pela vigília que as empresas tomadoras devem exercer sobre as prestadoras. Não se admite no balizado ordenamento pátrio a coisificação do homem e seu tratamento desumano e cruel em qualquer hipótese. Os crimes de violências físicas ou morais devem ser rigorosamente apurados e seus agentes punidos, tanto e especialmente caso comprovada a participação ou condescendência das forças de segurança do Estado Riograndense nos episódios de repressão e tortura denunciados pelos trabalhadores.
Assim, o Ipeatra reafirma seu mais veemente repúdio, e mais uma vez pugna pela aplicação integral do ordenamento jurídico nacional e internacional, este formatado pela ONU desde 1948, no sentido da responsabilização criminal, civil, administrativa e trabalhista da inteira cadeia produtiva de qualquer setor econômico que admita ou tolere, por ação ou omissão, direta ou indiretamente, práticas de trabalho escravo ou forçado e condutas violadoras do trabalho decente e da dignidade humana.