Gérson Marques
Pós-Doutor em negociação coletiva, Professor do PPGD/UFC, Subprocurador-Geral do Trabalho
O STF concluiu, em 25.11.2025, o julgamento de Embargos de Declaração no ARE nº 1.018.459, cuja decisão gerara o tema 935, a respeito da taxa assistencial, cobrada pelos sindicatos profissionais e de patrões. A tese iniciialmente firmada não foi modificada nesses EDs. Porém, houve efeito integrativo na decisão adotada nesses novos Embargos Declaratórios à tese firmada anteriormente.
Inicialmente, é de se observar que a decisão acolhe uma antiga reclamação dos sindicatos profissionais: a interferência dos patrões no direito de oposição dos trabalhadores. Embora não sejam mencionadas as consequências desta prática, sabe-se que ela se encaixa na modalidade de conduta antissindical, a atrair reparações cíveis (morais), multas judiciais e obrigações de não fazer.
Todo os percalços da tese firmada no Tema 935 foram esclarecidos nesta página eletrônica, em https://d3eihfknihgo3p.cloudfront.net/wp-content/uploads/2024/02/Retorno-da-taxa-negocial-2023.pdf.
Para relembrar, o STF fixara, em 18.09.2023, o seguinte:
Tema 935 (tese): “É constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais a serem impostas a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição.”
Porém, ocorreram várias situações abusivas da abertura ou guinada proporcionada pela decisão do STF, a qual autorizara aos sindicatos cobrar taxa assistencial, respeitado o direito de oposição. Eram casos de cobranças retroativas a períodos anteriores à fixação da tese e em valores elevados. Tais situações, que comprometiam a tese, ensejou a apresentação de novos Embargos de Declaração pela Procuradoria-Geral da República e por uma entidade patronal. Ao julgar os Embargos, o STF lançou a seguinte decisão, complementando o sentido da tese:
Decisão (nov/2025): “O Tribunal, por unanimidade, acolheu os embargos de declaração, com efeitos integrativos, para determinar que: i) fique vedada a cobrança retroativa da contribuição assistencial em relação ao período em que o Supremo Tribunal Federal mantinha o entendimento pela sua inconstitucionalidade; ii) seja assegurada a impossibilidade de interferência de terceiros no livre exercício do direito de oposição; e iii) o valor da contribuição assistencial observe critérios de razoabilidade e seja compatível com a capacidade econômica da categoria. Tudo nos termos do voto do Relator, Ministro Gilmar Mendes. O Ministro André Mendonça acompanhou o Relator com ressalvas. Plenário, Sessão Virtual de 14.11.2025 a 25.11.2025” (Certidão de julgamento).
Enquanto isso, corre no TST o IRDR-1000154-39.2024.5.00.0000, visando uniformizar “a questão exclusivamente de direito que trata sobre o modo, o momento e o lugar apropriado para o empregado não sindicalizado exercer seu direito de oposição ao pagamento da contribuição assistencial”.
A decisão do STF influenciará parcialmente o IRDR do TST, porquanto fixa a “impossibilidade de interferência de terceiros no livre exercício do direito de oposição”. Então, o modo de oposição passa a ser orientado por esse critério, podendo o TST esclarecer melhor como isso se verificará. Para o STF, a interferência na liberdade de oposição do trabalhador não pode ocorrer por empresas nem pelas próprias entidades sindicais.
Embora não conste da certidão de julgamento, os fundamentos do acórdão relatado pelo Min. Gilmar Mendes (STF), em vias de publicação, aduz alguns elementos sobre a forma de oposição dos não filiados, admitindo que se dê não apenas pela via presencial no sindicato, mas também pela mesma maneira como se dera a filiação, sem criação de obstáculos. Na mesma toada, o voto lançado pelo Min. Gilmar Mendes reconhece a prática empresarial de interferir na relação entre o sindicato e seus representados, no fomento da oposição dos trabalhadores, o que constitui conduta antissindical. Veja-se o voto lançado nos autos: https://digital.stf.jus.br/decisoes-monocraticas/api/public/votos/339366/conteudo.pdf.
Do voto (por enquanto, publicada a Certidão de julgamento), extrai-se:
“Nesse contexto, a Procuradoria-Geral da República, em seus embargos de declaração, manifesta preocupação quanto à possibilidade de interferências econômicas externas comprometerem o livre exercício do direito de oposição, o que poderia enfraquecer a utilização da via coletiva como instrumento de aprimoramento das condições de trabalho.
Considero a preocupação plenamente legítima.
Nas razões recursais, o Parquet destaca o risco de intervenção indevida por parte do empregador. Contudo, observo que não apenas o empregador pode restringir a liberdade de oposição. Casos relatados na mídia evidenciam que alguns sindicatos também têm imposto obstáculos à manifestação dos trabalhadores.
Em algumas situações as entidades sindicais exigem a apresentação presencial da oposição, mediante entrega de carta na sede do sindicato, por vezes com prazos bastante reduzidos. Em outras ocasiões, trabalhadores denunciam dificuldades para formalizar a oposição por meio de sites disponibilizados para esse fim, que frequentemente apresentam falhas ou ficam indisponíveis, ocasionando longas filas nas portas das entidades. Nesse sentido, confiram-se, dentre inúmeras outras, as seguintes reportagens:
– https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/trabalhadores-fazem-fila-gigante-para-nao-pagar-contribuicao-sindical-em-sp/
– https://cbn.globo.com/sao-paulo/noticia/2025/01/14/trabalhadores-enfrentam-longas-
filas-para-entregar-carta-de-oposicao-a-pagamento-de-contribuicao-sindical.ghtml
– https://www.agazeta.com.br/es/economia/sindicato-descumpre-decisao-judicial-e-multidao-protesta-contra-taxa-
no-es-0525
– https://www.band.uol.com.br/bandnews-fm/noticias/trabalhadores-de-metalurgicas-de-sp-enfrentam-
filas-mensais-no-sindicato-da-categoria-202411220946
– https://www.diariodesuzano.com.br/cidades/servidores-fazem-fila-na-porta-de-sindicato-para-nao-pagar-3-de/84144/
Verifica-se, portanto, que a atuação de alguns sindicatos tem, de forma inequívoca, dificultado indevidamente o direito assegurado pelo STF aos trabalhadores não sindicalizados de apresentar oposição ao pagamento da contribuição assistencial.
Diante disso, é fundamental registrar expressamente que é indevida qualquer intervenção de terceiros, sejam empregadores ou sindicatos, com o objetivo de dificultar ou limitar o direito de livre oposição ao pagamento da contribuição assistencial.
É imprescindível, ainda, que os trabalhadores disponham de meios acessíveis e eficazes para formalizar sua oposição, assegurando-lhes o uso dos mesmos canais disponíveis para a sindicalização.”
Outro ponto é o trecho em que o voto afirma: “Assim, após a devida convocação da assembleia para garantir a ampla divulgação sobre a cobrança, deve-se assegurar ao trabalhador o exercício do direito de oposição.” Embora se saiba que surgirão algumas interpretações – equivocadas, diga-se – de que a oposição seja necessariamente feita em assembleia, não é isto o que se extrai do contexto do voto. No trecho transcrito, o voto se refere a um dos objetivos da assembleia: “a ampla divulgação sobre a cobrança”. Após ela, dar-se-á a oportunidade para o exercício do direito de oposição.
Então, a assembleia é o instrumento para estabelecimento da taxa negocial, embasada em acordo ou convenção coletiva de trabalho. Na assembleia, ainda, será dada ampla divulgação da cobrança. É o momento da ciência. Mas a cobrança é condicionada ao direito de oposição. O voto não diz qual será o prazo, mas estima-se que seja o razoável. Parece-nos razoável prazo de 15 dias ou superior, a depender das características da entidade e da categoria. Mas o TST poderá tratar desse prazo, até que lei regule a matéria, no IRDR-1000154-39.2024.5.00.0000.
Portanto, continua valendo a tese fixada no tema 935-STF, permitindo que a taxa assistencial seja fixada em assembleias legítimas, por acordo ou convenção coletiva, assegurado o direito de oposição dos não associados. É vedada qualquer interferência na liberdade de oposição, por empregadores ou entidades sindicais. E o valor deve ser o razoável. Entendemos que, pelo contexto do voto (por enquanto, publicada a Certidão de julgamento), a oposição se dará em prazo também razoável, conforme as peculiaridades da entidade sindical e da respectiva categoria.
No mais, sem fugir destas premissas, o TST poderá esclarecer melhor no IRDR, que valerá até que lei regulamente a matéria.
São estas as primeiras considerações. Com a publicação do acórdão, poderão ser complementadas ou revistas.
